sábado, 31 de julho de 2010

Na Periferia - Uma psicoantropotopografia

Adoro as boas e velhas concepções burguesas de revolução social [utopias de salão]. Na verdade, diversas vezes me pego pensando de maneira a encarar o mundo composto por pessoas homogêneas: mesmos métodos, mesmos resultados; doce ilusão!

Um breve passeio pela periferia de qualquer cidade num fedorento sábado de sol e temos que encarar a realidade. A micro-esfera social que consideramos mundo (nossa cidade) está repleta de surpresas, principalmente por sobre a social-topografia.

Achamos mesmo que as pessoas querem mudar?

pensemos diferente. e o crime organizado, por exemplo? o que acontece com a derrubada do Estado - ou pior, na sua substituição (é a tese de que devemos sempre ter um palhaço armado para nos comandar), estaríamos fortalecendo os outros micro-poderes? mas o ponto ainda não é esse, e sim: elas querem o quê? se a maioria não for autônoma em seus desejos, absolutamente abaixarão a cabeça para o próximo micro-poder que se impuser macro.

entendamos: desejos diferentes. ideologias (ou antiideologias, ou a-ideologia), diferentes marcas, diferentes passados, diferentes futuros, planos, etc.

no carona, observo: dezenas e dezenas de pessoas sentadas, à porta de suas casas, olhando o tempo passar [flores secando]. Não estavam em sua maioria conversando coisas úteis [no sentido de se organizar, melhorar sua situação, tentar sair daquele estado, etc], mas batendo papo, bebendo cerveja... relaxando de um sábado fedorento. Muitos dirão: estão sim, produzindo um capital social. Eu vejo de outra forma, é a Cultura Popular de Valorização da Ignorância como Forma Inconsciente de Protesto (alguns comentarão ainda como antiintelectualismo, mas já acho que não encaixa, prefiro a CuPoVaIFIP).

Aquelas pessoas, alí, de bobeira, durante a semana toda, criaram uma forma de validação social própria: a recusa do status habitual burguês e sua aceitação do ritual de ter para fingir ser (nunca sendo); aquela população acabou não tendo (muita concorrência e exclusão por gerações - as ondas correm do centro para a periferia, afastando tudo) e sem saber exatamente o que ser.

Calma, muitos já começam a tremelicar de indignação [seu pequeno-burguês elitista!], mas vou continuar. Vou na rapaziada de frankfurt e nas interpretações daquilo que se conhece hoje por indústria cultural (mas não vou me aprofundar, lá ra lá lá ra lá!) para dizer que, em muitas periferias, a cultura que se diria popular foi dilacerada de tal maneira pela cultura estandardizada, que não se sabe até que ponto é uma esquizofrenia cultural ou a emergência de uma identidade dazed & confused.

Recusa-se o "ter", mas almeja-o. Abraça-o na primeira oportunidade, pois é o "ter" que mostra sua posição. Só se simula "ser" enquanto não se "tem". Só enquanto não se "tem" é que se valoriza o "ser" e se simula, pois. Enquanto a maioria não "tem", não tem problema, é sinal que tudo vai mais ou menos bem [eu não estou tão atrasado, se meu vizinho também está atrasado!].

As filosofias de salão não abarcariam jamais a linguagem que se propaga pela periferia. Nem de longe estou deificando a "cultura esquizofrênica da periferia", nao estou nem vou deificar porcaria de cultura nenhuma. Não se trata de uma cultura superior por se propor livre da cultura burguesa. nenhuma nem outra, e nem nenhuma outra se põe superior - todas são boas ou ruins dependendo do que se quer. Por isso, repito, as filosofias de salão não conseguem falar a linguagem de que m não sabe se quer.

Vão, socialISTAS, vão lá levar o partidão pra periferia, mas levem seu batalhão. AnarquISTAS, onde está a organização? e com mil diabos, como vão trazer os conceitos à realidade? Aquelas pessoas acreditam que estão sendo favorecidas de alguma maneira no estado onde estão. Como mostrá-las que estão sendo prejudicadas, principalmente quando optam pela ignorância? No fim, a única ideologia que alcança a todos, e bem, é a da Televisão.

O Wilson falava idilícamente da posição da recusa, e nesse caso, muitos diriam: oh, sim, eles estão se recusando a aceitarem o sistema como é! é uma atitude de rebeldia! ressalvo: não! os melhores salários (que nunca são os melhores salários!) compram logo os apetrechos de distinção, compra-se uma moto, ou se tuna o carro [sórdida inocência], ou se compra um computador (159 gigas de puro espaço vazio), um celular que dentre tudo bate bolos, etc. Quinquilharias; logo "temos", sem nem mesmo "ser" - o "ser" aqui é meramente simulação, uma aceitação momentânea causada - penso eu - pelo desespero do não-saber o que fazer.

mais um ponto para a rebelião pessoal...

a busca pela conhecimento deve ser atiçada... cutuca-se a apatia até que ela se enfeze e perceba o demônio que lhe cerca. Mas nenhum passo será dado sem a vontade própria do sujeito. não será possível carregar ninguém: as utopias estão aí para encantar, mas o patético e viver previamente nelas! andamos nas brumas, mas pisamos no concreto.

Quais passos daremos nessa enorme psicoantropotopografia?? - Cada um que faça o que estiver ao seu alcance, mas FAZENDO MESMO!!

As pessoas estão sempre me surpreendendo. Eis um sábado fedorento de sol.

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