segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Um Soco no Ar: Controlando Tempestades.

    Todo marinheiro nasceu para capitão.
    Mas muitos passam toda a vida limpando o convés e morrendo em batalhas que não sabem por quê se dão. 
     Mal sabem os homens que todos já possuem seus navios, e suas espadas, e seus canhões, e o poder do grito que ecoa por sobre toda a Terra. Mas ainda não sabem o que gritar, contra quem gritar... têm medo de chamar a atenção, de virarem alvos fáceis e solitários. Medo da solidão. Um ponto no meio do mar.

     Um homem solitário navegou em sua jangada até o meio do oceano para descobrir que não importa para onde fosse, sempre haveria um horizonte, e nele, os seus iguais. Gritou sozinho no meio do deserto para chamar os homens para batalhar, o louco, o visionário. Ninguém o escutaria - claro - pois gritava o que nenhum ouvido podia sentir, pois não se sente aquilo que não conhece. Ergueu-se aos céus para ver melhor, mas só viu formigas, e imaginou que seus iguais assim fossem - meras formigas. Voltou ao oceano, voltou à sua jangada, inconformado... e teve de voltar a ser um verme para repensar a humanidade. A descobriu dentro de si. Viu a humanidade dentro de um verme, e um verme em cada ser humano.
     A escuridão de seu casulo, a solidão da imensidão, a dúvida de "para onde ir", a ignorância da crença coletiva passiva, a falta de curiosidade e de garra, tudo o que ele via nos outros sentiu partir dele mesmo. Um homem que tentava agarrar um grão de poeira no deserto, uma imensidão de histórias e sentimentos, de desejos e de complexos, em cada formiga, ele estava, sendo ele mesmo, formiga.

     Um dia um homem que morava numa cabeça se materializou quando se rebelou contra um gigante, que aos olhos dos outros, parecia apenas um moinho. Ele e sua espada erguida - a imagem que fez de uma idéia um homem, parte de uma guerra que dura milênios. Foi mais um... mas foi um capitão, autônomo, temporário... das suas idéias bebemos e somos fortes até hoje. Para os outros, veneno, para nós, é a água mais límpida. Mitridatismo, então.

     Entendeu.
     Nenhum homem viverá para sempre, somos temporários, perecíveis. Não lembramos de carnes, a lembrança é mera idéia. Somos troncos por onde as idéias fluem e se transformam nas mais belas flores e frutos, que vão continuar se propagando até que a última mente humana possa entendê-las. Os troncos apodrecem, a memória, não.

      No meio do oceano, um homem ergue um pulso, e o nomeia sua espada. Sua jangada é o maior navio de guerra já imaginado. Um mastro atravessa seu coração e, lá no alto, só uma bandeira se agita. 
Sua imagem materializada atrai outros capitães materializados. A cada um que morre, nascem mil! Já emerge dos oceanos a esquadra insurreta! Somos a dinamite que nunca apodrece, e estamos, há milênios, explodindo pilares podres dos jardins suspensos da babilônia. 

     Ouço a risada de um velho bucaneiro, e ela é um chamado. Ela é a chama que nos faz ver uma ilha distante, mas apaixonante, sempre distante como uma Dulcinéia: essa ilha é o que move nossa esquadra há milênios, e a chamamos Liberdade.