quarta-feira, 27 de abril de 2011

Passo Além do Óbvio - da pequenez à grandeza do Ser.

Infundidos na vida cotidiana, somos convencidos desde criança a viver nessa distopia como se nada estivesse acontecendo - ou melhor, como se nada melhor fosse possível acontecer. Nosso papel nessa sociedade é o de consumir e o de ser esteticamente igual ao outro - sendo assim, paradoxal e impossivelmente diferente. Assumimos, desde sempre, os velhos hábitos "aceitáveis" como sendo nossos, como sendo espetaculares. Assumimos nossas vidas medíocres como as melhores possíveis, enxergamos no horizonte a desgraça de coturnos policiais e sapatos de couro polidos e nos parece um pôr-do-sol - em sangria, e eis sua "beleza"...

Nos ocupamos da vida de supostas celebridades, dedicamos dourados minutos de nossas vidas à leitura ("mas é dinâmica!") dos acontecimentos da novela das 6, ou do enlatado norte-americano, guardamos nossos sagrados domingos e quartas-feiras para o não menos sagrado futebolzinho, imolamos nossas celebrações em churrascos regados à cerveja e papo-furado, cimento-de-merda, nosso cigarrinho de manhã e a noite, um paierozinho pra enganar a tarde, uma cervejinha com o dinheiro do mercado, cannabis é revolta é revolução pacífica, capitalismo é uma bosta me vê uma coca-cola e um número Um, vou votar no domingo fala um número, a vida segue, e para nós, vai bem, já que supostamente é isso aí, a vida.

Estamos preocupados com os minutos do celular! Estamos preocupados em acordar cedo! Estamos com preguiça de pensar na morte da bezerra! estamos preocupados com a radiação no Japão (ai se me chega!)! Temos que caminhar 15 minutos a cada dois dias, mas eu começo na segunda! Minha vizinha me chamou de gorda! Tem baladinha na sexta, vou encher a cara e pegar todo mundo! Baixei todas da lady gaga vôpôpcêôvi no celular novo, quatro chips, mas só tenho dois e tô sem crédito!

Assolados pelas solas do cotidiano, rastejamos nossas vidas agradecendo a deus por ser nosso senhor (!).

Cessão das nossas vidas ao mediocre do dia-a-dia, ao individual, ao pouco, ao pequeno, ao mínimo, às rixas, às masturbações, às pequenas sacanagens, às pequenas filhadaputagens, às misérias que chamamos paraíso. Compre sua revolução, descartável, amanhã é outro dia - impressionante como parece com ontem, e a maldição não dormir à noite, não viver de dia, não saber o que sonhei, o que comi ontem...

Um dia se acorda, mesmo sem dormir. Ouço os passarinhos cantando muito além dos sapatos de couro engraxados. Já não me importa o que o noticiário está dizendo, já não me interessa quem venceu as eleições, quero saber se a horta da esquina está rolando, coloco um classificado psíquico "Procuro pessoas que já não moram mais aqui". Já não registro queixas na delegacia com esperança ou esperando a boa vontade do sistema, o supermecado se reduz cada dia mais, meu mundo capitalista vai desmoronando, ele se torna cada dia mais força do que jeito, pois cada dia que eu imponho mais minha liberdade, mais o capitalismo força a barra, e logo sei que sabe meu nome. Sou perigoso porque o capitalismo não me importa. Meu jeito de ver o mundo é trabalhoso mas contamina mesmo assim. Não sou eu, Eduardo Montenegro, o centro desse artigo, mas você, operando a realidade e destruindo os próprios mecanismos psíquicos que te controlam: superando seus vícios, superando o egoísmo, buscando o Outro nas esquinas, abrindo a boca mais para falar do que para beber o cafézinho da repartição, apagando um maço de cigarro antes de acender, desafinando o coro dos contentes, sendo o chato da turma, mas que ninguém te esquece, sendo um ponto de pressão numa rede social invísivel, supostamente controlada pelo poder, andando num mundo de cabeça para baixo, de cabeça para cima.

Abdicar do óbvio. Não aceitar o que está entregue. Conhecer o mundo pelas mãos. Superar a si mesmo para superar o mundo. Inventar novas formas de se relacionar com tudo e todxs... tudo isso está sendo dito e repetido a todo momento, por inúmeros pensadores mas... até quando você só vai ficar ouvindo?

é preciso NÃO QUERER ser pequeno. Desejar o mundo mais do que o mundo que nos é imposto. Sonhar com o além-merda para descobrir os impossíveis possíveis. As coisas estão aí - mas muito além da nossa medíocre vida cotidiana, há muito mais... talvez as nossas próprias vidas. Quando vamos querê-las de volta?

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